A impunidade gerando crueldades
A Constituição Federal incumbiu
o Poder Público de proteger os animais, inclusive, quanto à crueldade. Além
disso, a Lei Maior utiliza a expressão “assegurar a efetividade desse
direito”.
É
curioso que a Constituição Federal impõe
a incumbência ao Poder Público de proteger determinado direito e, ainda,
enfatiza a necessidade de que este assegure sua efetividade. Mesmo com a
ênfase, o Poder Público não tem cumprido a determinação.
Até o momento, é evidente, não há qualquer eficácia
do Poder Público em proteger os animais, seja quanto às espécies em extinção,
seja quanto ao tráfico de animais silvestres, seja quanto aos atos de
crueldade ou maus-tratos.
Ao se falar de Poder Público e defesa dos direitos
dos animais, tem-se, necessariamente, que se distinguir a atuação do Poder
Judiciário, Poder Executivo e Poder Legislativo, a fim de identificar a razão
da vergonhosa e gritante ineficácia.
Qual seria a parcela de culpa do Poder Judiciário
quanto a este tema? Há certa dificuldade em atribuir responsabilidades ao
Judiciário, quando não há leis que pretendam, de fato, punir os infratores.
Vejamos.
A Lei de Crimes Ambientais (Lei nº. 9.605/98) prevê a pena
de “detenção, de três meses a um ano, e multa” àquele que “praticar
ato de abuso, maus-tratos, ferir ou mutilar animais silvestres, domésticos ou
domesticados, nativos ou exóticos” (art. 32).
Em simples palavras, a pena de detenção de 3 (três)
meses a 1 (um) ano e multa significa que o agressor não ficará preso,
independente da gravidade de sua conduta ou extensão da crueldade. Em outras
palavras, não há pena capaz de inibir o criminoso, por maior que seja sua
atrocidade.
Em que pese seja óbvio aos que possuem conhecimentos
jurídicos, não o é para uma grande parte da população que, por vezes, revolta-se
contra a autoridade policial ou contra o Poder Judiciário, justamente, por
desconhecer a verdadeira razão da impunidade.
Leva-se o acusado à delegacia, abre-se o inquérito.
Contudo, nem delegado, nem juiz possuem fundamento legal para mantê-lo
recluso. Tem-se que soltá-lo.
Em razão disso, é necessário conscientizar à
sociedade de que jamais haverá verdadeira proteção aos animais, enquanto não
houver penas capazes de desestimular as práticas de crueldade.
Logo,
há a necessidade de especial atenção à iminente reforma do Código Penal Brasileiro,
para se verificar qual será, de fato, a pena imposta aos que insistem em
praticar os abusos contra os animais.
Desse
modo, evidencia-se a responsabilidade dos eleitores em cobrar de seus
candidatos uma resposta efetiva, quanto ao tema, para que os projetos de lei
deixem de rastejar e sejam aprovados. E, como dito, haja atenção quanto à
iminente reforma do Código Penal, a fim de que a pena imposta aos infratores
seja capaz de desestimular as crueldades.
Contudo, uma grande parcela da sociedade nunca, nem
mesmo, visitou o site da Câmara dos Deputados ou do Senado, a fim de
acompanhar um projeto de seu interesse. É impressionante, mas basta fazer uma
pesquisa informal, para se confirmar esta afirmação.
Correto seria cada eleitor cobrar a atuação ou
posicionamento de seu candidato quanto aos anseios da sociedade. Contudo,
muitos eleitores não se lembram, nem mesmo, em quem votaram na última
eleição.
Quando uma grande parte da sociedade ignora e
desconhece as atividades do Poder Legislativo, permite-se a este que não atue
com agilidade e seriedade, acomodando-se em uma zona de conforto e
negligência.
Lado outro, deve-se lembrar que, embora a maioria
das pessoas seja a favor do endurecimento das penas relativas aos direitos
dos animais, há, contudo, aqueles que se sentem ameaçados.
Não se pode esquecer, por exemplo, que o tráfico de
animais silvestres é um mercado que movimenta bilhões. Segundo aassociação
ecologista internacional World Wide Fund for Nature (Fundo Mundial para a
Natureza - WWF), este mercado “gera 15 bilhões de euros por ano. No Brasil
a participação deste mercado chega na casa de 1 bilhão de euros”
(Wikipédia).
Falando-se em bilhões, não há necessidade de se prolongar
quanto à resistência que alguns projetos de lei sofrem. Vale dizer, a
crueldade com animais é atividade lucrativa não só em relação ao tráfico de
animais, mas, também, em relação a outras atividades como rodeios,
vaquejadas, rinhas de galo, circos etc. Há um evidente conflito de
interesses.
Em
razão de tal conflito, cabe à sociedade cobrar do Poder Público que cumpra a Constituição Federal, assegurando a efetividade dos
direitos dos animais. A uma, investindo nos órgãos de proteção, como centros
de controle de zoonoses, polícia militar ambiental, IBAMA. A duas,
fiscalizando a correta destinação e utilização do dinheiro público, a fim de
se evitar desvios.
O Decreto 24.645/34, em seus artigos 1º e 2º também
dispõe acerca da tutela dos animais, ao determinar que: “Todos os animais
existentes no País são tutelados pelo Estado”; e “Os animais serão
assistidos em juízo pelos representantes do Ministério Público, seus
substitutos legais e pelos membros das Sociedades Protetoras dos Animais”
(evitou-se o debate quanto à revogação deste Decreto).
Por fim, espera-se que a mobilização contra a
crueldade com os animais seja capaz de conscientizar a sociedade e
sensibilizar o Poder Legislativo, cobrando, também, do Poder Executivo
investimento nos órgãos e departamentos responsáveis, bem como a fiscalização
do dinheiro público empregado.
"Chegará o dia em que todo homem conhecerá o
íntimo dos animais. Nesse dia, um crime contra um animal será considerado um
crime contra a própria humanidade." (Leonardo da Vinci).
O autor, Adriano Martins Pinheiro, é advogado,
palestrante e escritor.
Fonte: JUS BRASIL
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