Empregados que entraram com ações
trabalhistas têm conseguido receber indenizações antes que os processos sejam
encerrados definitivamente na Justiça. O argumento é que necessitam do
dinheiro urgentemente por motivo de doença, endividamento ou desemprego. O
Judiciário tem autorizado o resgate dos valores depositados pelas companhias,
com a finalidade de garantir as ações, ainda que uma possível condenação
possa ser revertida futuramente. Há julgamentos nesse sentido nos Tribunais
Regionais do Trabalho (TRTs) de Minas Gerais, Goiás, Paraíba, Alagoas e
Pernambuco.
As decisões, ainda raras, aplicam o
Código de Processo Civil (CPC) nas discussões trabalhistas. O artigo 475-O,
parágrafo 2º, inciso I, diz que o valor caução depositado pode ser dispensado
nos casos de crédito de natureza alimentar ou decorrente de ato ilícito, até
o limite de 60 salários mínimos - hoje a quantia de R$ 40. 680. Porém, a
parte deve demonstrar situação de necessidade. O artigo foi incluído por lei
no código, em 2005, para dar mais efetividade à execução judicial.
O uso desse dispositivo na Justiça do
Trabalho ainda é polêmico e o Tribunal Superior do Trabalho (TST) tem negado
pedidos. Contudo, ainda não há uma jurisprudência consolidada sobre a
questão.
No Tribunal Regional do Trabalho de
Minas Gerais (TRT-MG), os magistrados liberaram R$ 5 mil a uma faxineira que
trabalhava para uma instituição de ensino. A escola foi condenada, em segunda
instância, a pagar indenização por danos morais e materiais por ser
responsável por um acidente de trabalho. O relator, desembargador Fernando
Luiz Gonçalves Rios Neto, da 7ª Turma, seguido por maioria, determinou o
pagamento imediato da quantia. Segundo ele, ainda que se trate de execução
provisória, é cabível a liberação do depósito judicial ao empregado que alega
estado de necessidade. Da decisão, porém, cabe recurso.
Para aplicar o CPC, o desembargador
citou o artigo 769 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), segundo o qual
o direito processual comum será fonte subsidiária do direito processual do
trabalho, nos casos omissos, exceto no que for incompatível com a CLT.
O magistrado considerou que como a
faxineira é beneficiária da Justiça gratuita, ou seja, não tinha dinheiro
para pagar um advogado, sua condição financeira estaria clara. "A situação
de necessidade do empregado é presumida no direito do trabalho, que existe,
como ramo da ciência do direito, exatamente para supri-la, dotando o
trabalhador de vantagens jurídicas para compensar a superioridade econômica
do empregador", diz.
O TRT de Alagoas também permitiu que
uma trabalhadora resgatasse o depósito, em uma execução provisória, para
pagar tratamento de saúde. A ex-chefe alegou no processo que a liberação do
depósito recursal no início da execução provisória poderia trazer a ela
enormes prejuízos financeiros. Isso porque dificilmente conseguiria reaver os
valores liberados, "pois trata-se de pessoa pobre e que não terá
condições de arcar com o ressarcimento do crédito". Os desembargadores,
porém, foram unânimes ao autorizar o uso da quantia.
Segundo o relator, desembargador João
Batista, não há qualquer ilegalidade na decisão de primeira instância, por
ser respaldada pelo CPC. Ainda afirma que o crédito é de natureza alimentar;
que há necessidade na liberação do dinheiro para tratamento de saúde; e que o
valor a ser liberado - R$ 5,6 mil - está bem abaixo do limite permitido de 60
salários mínimos. O TRT da Paraíba também liberou valores antes da execução
definitiva em um processo que a parte alegou estar desempregada e
necessitando de dinheiro.
As decisões também dividem opiniões
entre advogados trabalhistas. Segundo Pedro Gomes Miranda e Moreira, do Celso
Cordeiro de Almeida e Silva Advogados, "são muito baixas as chances do
empregador recuperar o valor, caso consiga reverter a condenação nas
instâncias superiores". Isso porque são pessoas pobres que já terão
gastado esse dinheiro.
Para Moreira, esses julgados devem
ser revertidos no TST, que tem sido contrário ao procedimento nas poucas
decisões existentes. Até porque, diz, o paragrafo 1º do artigo 899 estabelece
que o levantamento do depósito judicial só pode ser feito nos processos que
transitaram em julgado, quando não cabe mais recurso.
Já para a advogada Mayra Palópoli, do
Palópoli Advogados Associados, a tendência deverá se intensificar, devido ao
caráter alimentar das indenizações. "A previsão do CPC é mais recente e
reflete os princípios e objetivos do processo trabalhista."
Para a professora de direito do
trabalho na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), Carla
Romar, do Romar Advogados, a liberação desses valores pode ser admitida,
desde que não exista dúvida sobre a titularidade da dívida. Ou seja, quando
não envolve um grupo econômico ou sucessão, no qual pode se decidir
futuramente que aquela empresa não é a responsável pelo pagamento. "Isso
deve ser aplicado com cautela, quando o juiz tiver segurança de que
dificilmente sua decisão será modificada", afirma.
Juliana Bracks, do Bracks & von Gyldenfeldt Advogados Associados,
também apoia as decisões dos TRTs. "Elas vêm para dar mais efetividade
na execução", diz. Segundo a advogada, o CPC estabelece que esse
dinheiro só pode ser liberado quando o processo está apenas pendente de
agravo nos tribunais superiores, no caso o TST. "Essas decisões
dificilmente serão reformadas e isso evita que agravos absolutamente
descabidos atrasem o pagamento de indenizações."
Por Adriana Aguiar
Fonte: Valor Econômico
|
Nenhum comentário :
Postar um comentário
Deixe aqui o seu comentário, dúvida ou sugestão