Sem tirar férias por cinco anos, uma publicitária, diretora de contas
da McCann Erickson Publicidade, em Brasília, obteve na Justiça indenização
por danos morais contra a empresa. O mesmo ocorreu com um vigilante que
prestava serviços para o Banco do Brasil que alegou ter passado dez anos sem
descanso. Queixa semelhante de um empregado que trabalhava como cortador de
pedras da Mármores e Granitos Teixeira, em Matozinhos (MG), que comprovou ter
ficado 14 anos sem férias, também foi motivo de indenização na Justiça do
Trabalho. Todos alegaram nos processos que, apesar de receberem as férias, as
empresas não os deixavam usufruir.
No Tribunal Superior do Trabalho (TST), a publicitária recebeu R$ 5 mil e o
vigilante R$ 10 mil por danos morais. Os trabalhadores ainda ganharam o
pagamento das férias, dos últimos cinco anos, em dobro. O Tribunal Regional
do Trabalho (TRT) de Minas também condenou a marmoraria em R$ 5 mil, mais as
férias dobradas.
O empregado pode vender um terço de suas férias, segundo a Consolidação das
Leis do Trabalho (CLT), mas não pode ser obrigado pela empresa a deixar de
tirar o restante do período de descanso. Por esse motivo, a Justiça tem
condenado empresas ao pagamento de danos morais.
No caso da publicitária, o Tribunal Regional do Trabalho (TRT) da 10ª Região,
em Brasília, havia excluído os danos morais, sob o fundamento de que o
prejuízo pelas férias não usufruídas já teria sido compensado com o pagamento
em dobro das férias, punição prevista no artigo 137 CLT. O dispositivo
estabelece que, sempre que as férias forem concedidas após o prazo, o
empregador pagará em dobro a respectiva remuneração. Segundo a legislação, o
funcionário trabalha um ano para ter direito a usufruir do período de férias
no ano seguinte. Nesse segundo ano, o empregado tem mais um ano para retirar
as férias. Caso contrário, a retirada já é considerada fora do tempo e deve
ser indenizada.
Apesar de o relator no TST, ministro Aloysio Corrêa da Veiga, manter o
entendimento do TRT, ele foi vencido por maioria na 6ª Turma ao analisar o
caso da publicitária. Para a ministra Kátia Arruda, que abriu a divergência,
a dobra de férias só seria suficiente em casos pontuais. "Aqui é uma
situação reiterada, ano a ano, de 2004 a 2009", destacou, ao propor a
indenização por danos morais. Segundo ela, houve um prejuízo moral, porque,
além de não gozar férias e ser sobrecarregada com acúmulo de funções, a
gerente não pôde descansar, tirar férias com os filhos, sendo privada de
momentos de lazer e convívio familiar, com implicações à saúde e segurança.
O vigilante, que era contratado pela prestadora de serviço, a CJF de
Vigilância, para trabalhar para o Banco do Brasil também foi indenizado. A 7ª
Turma do TST condenou ambas, de forma subsidiária, a pagarem a indenização. A
relatora do processo no TST, ministra Delaíde Miranda Arantes, entendeu que a
atitude da empregadora de não conceder férias por mais de dez anos constitui
ato ilícito, ao colocar em risco a saúde do trabalhador, configurando-se,
ainda, quebra de boa-fé contratual.
Condenações por dano moral têm sido comuns quando há a prática reiterada da
companhia de não autorizar a retirada de férias, diz o advogado trabalhista
Otavio Pinto e Silva, do Siqueira Castro. "As companhias, que por algum
motivo, não conseguirem autorizar as férias dentro do prazo estipulado por
lei, em casos específicos, como picos de produção por exemplo, devem
indenizar com o pagamento em dobro", afirma.
Para a advogada Cristiane Haik, do Salusse Marangoni Advogados, as empresas
não podem se esquecer que direitos relativos ao descanso - férias, descanso
semanal e horário das refeições do empregado - são inegociáveis,. Cristiane,
porém, discorda das condenações por danos morais. "A Justiça está
extrapolando a sua função. Caberia apenas uma comunicação aos órgãos
fiscalizadores com o objetivo de fazer com que essas empresas não incorram
mais na prática".
A assessoria de imprensa do Banco do Brasil, por nota, informou que
"cumpre os preceitos da legislação trabalhista, não tem casos da espécie
com os seus funcionários e não tolera essa prática com os seus
terceirizados". Também afirma "que se trata de um caso
isolado". A McCann Erickson Publicidade informou por meio de sua
assessoria de imprensa que não iria se manifestar sobre o processo. A
Mármores e Granitos Teixeira não retornou até o fechamento da reportagem.
Período inferior a dez dias também gera dano
Reduzir as férias a períodos inferiores a dez dias também tem resultado em
pagamento de indenizações pelas empresas. No fim do ano passado, a Calçados
Azaléia foi condenada a pagar em dobro as férias de uma funcionária pela 2ª
Turma do TST. Para a Corte a decisão está em consonância com a jurisprudência
notória, atual e reiterada do tribunal.
O relator, ministro José Roberto Freire Pimenta, destacou que a legislação
privilegia a concessão das férias num único período e autoriza o
fracionamento de forma excepcional, desde que nenhum dos períodos seja
inferior a dez dias, conforme o disposto no artigo 134 da CLT. Segundo o
ministro, as férias têm o objetivo proteger a saúde do trabalhador e a
concessão de períodos inferiores a dez dias compromete sua finalidade, que é
"proporcionar descanso ao trabalhador para a reposição de sua energia
física e mental após longo período de prestação de serviços".
No recurso ao TST, a empresa alegou que o pagamento em dobro só é devido
quando as férias são concedidas fora do prazo estabelecido no artigo 134 da
CLT, e que o fracionamento ou antecipação não gera direito a novo pagamento,
por falta de amparo legal, mas seria apenas uma infração administrativa.
Porém, os ministros do TST entenderam que caberia reparação ao empregado.
De acordo com o advogado Otavio Pinto e Silva, do Siqueira Castro, a
legislação trabalhista brasileira é impositiva com relação à retirada de férias.
"O empregado é obrigado a tirar pelo menos vinte dias por ano, caso
queira vender dez dias". Assim, a empresa tem que marcar as férias de
seus funcionários e fazer com que ele tire esse período de descanso por ano.
A advogada Cristiane Haik, do Salusse Marangoni Advogados, lembra que pela
CLT o empregador pode escolher a data em que o empregado tirará seu descanso,
conforme o artigo 134 da norma. "As empresas deixam o empregado escolher
por mera liberalidade", afirma.
Procurada pelo Valor, a assessoria de imprensa da Azaléia não retornou até o
fechamento da edição. (AA)
Fonte:
Valor Econômico
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